Governo terá de alterar as leis para conceder os mesmos direitos às pessoas transgênero, o que o Supremo Tribunal considera ser
"uma questão de direitos humanos".
O Supremo Tribunal da Índia reconheceu legalmente a existência
de um terceiro gênero, numa decisão histórica que abre caminho à aprovação de
leis de proteção social à comunidade transgênero do país.
Os cidadãos têm agora a
opção de inscrever a sua orientação de gênero – masculino, feminino ou terceiro gênero – em todos os documentos oficiais, numa tentativa de travar a
marginalização e os atos de violência contra as pessoas que não se identificam
com uma divisão em apenas duas categorias.
"O reconhecimento das pessoas transgênero como um terceiro gênero não é uma questão médica ou legal, mas sim uma questão de direitos
humanos. Os transgênero são também cidadãos da Índia. O espírito da
Constituição vai no sentido de proporcionar oportunidades iguais a todos os
cidadãos para realizarem o seu potencial, independentemente da sua casta,
religião ou gênero", declarou o juiz KS Radhakrishnan.
A decisão do Supremo indiano aplica-se a uma parte da comunidade
conhecida como hijra – um termo usado para definir uma variedade de situações,
mas que neste caso em particular abrange eunucos, pessoas que se submeteram a
uma cirurgia para mudança de sexo e "todos os que se apresentem de uma
forma diferente da do sexo com que nasceram".
De fora ficam gays, lésbicas e bissexuais –
em Dezembro de 2013, o Supremo Tribunal anulou mesmo uma decisão de primeira
instância, de 2009, que defendia a descriminalização da homossexualidade. O Supremo argumentou que a lei que
classifica as relações entre pessoas do mesmo sexo como um "delito
não natural" (aprovada há 153 anos, durante a era colonial britânica) só
pode ser alterada pelo Parlamento.
A advogada Anita Shenoy, representante da Autoridade Nacional de
Serviços Legais indiana, mostrou-se "entusiasmada com a decisão"
anuciada nesta terça-feira. "O acórdão do tribunal reconhece legalmente a
existência do terceiro gênero. Os juízes disseram que o Governo deve garantir
que eles tenham acesso a tratamento médico e a instalações como áreas separadas
em hospitais e casas de banho próprias", explicou a advogada à BBC.
Abhina Aher, que se identifica como transgénero e trabalha na
organização sem fins lucrativos HIV/AIDS Alliance, contou ao The
New York Times a
conversa que teve com a mãe assim que a decisão do Supremo foi conhecida:
"Mãe, a minha situação já foi legalizada. Já não precisas de ter vergonha
de mim."
Geeta Pandey, directora-adjunta da BBC Online na Índia, explica
a importância dos hijra na história do país. "Os membros do terceiro
género desempenharam um papel proeminente na cultura indiana e foram em tempos
tratados com muito respeito", escreve a jornalista no site da BBC.
O período de marginalização e perseguição começou durante a era
colonial britânica, no século XVIII, com a aprovação de leis que criminalizaram
a homossexualidade, mas também os comportamentos das pessoas transgênero.
"Depois da independência, a lei foi abolida em 1949, mas a
desconfiança em relação à comunidade transgénero continuou. Ainda hoje
continuam a ser socialmente excluídos, a viver nas margens da sociedade, em
guetos, assediados pela polícia e agredidos pela maioria da população. Muitos
ganham a vida a cantar e a dançar em casamentos, e muitos tiveram de recorrer à
esmola e à prostituição", explica Geeta Pandey.
Disponivel em: http://www.publico.pt/mundo/noticia/india-reconhece-transexuais-como-terceiro-genero-1632338
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