Com personagens transgêneros mais realistas, Hollywood
pode estar ajudando a sociedade a aceitá-los na vida real – inclusive as
crianças transgêneros.
Um número cada vez maior de crianças está usando
medicamentos bloqueadores da puberdade para evitar mudanças indesejadas
em seus corpos, como o crescimento de seios ou de barba.
O tratamento é controverso. Críticos dizem que bloquear a
puberdade de uma criança é um tipo de abuso e que elas devem ser
aconselhadas a aceitar seu corpos.
Mas pais de crianças com desordem severa de identidade
de gênero e médicos que tratam delas dizem que não fazer nada pode ser
perigoso e que deixá-las passar pela puberdade “no gênero errado” pode
resultar em depressão profunda e suicídio.
"Quando eu era pequena sempre dizia: ‘Eu sou uma garota.
Eu me pareço uma garota. Meu coração é de uma garota", diz Zoey, de 13
anos, que nasceu menino mas se identifica como menina.
Zoey diz que seu coração é de mulher/ Foto: BBC
'Não incitei minha filha a passar por isso', diz mãe de Zoey
O médico dela bloqueou sua puberdade e prescreveu hormônios para ajudar que se desenvolva como uma mulher.
"Quando fiquei mais velha, consegui chegar ao meu
objetivo e podia ser aceita em escolas, o que tinha sido a parte mais
difícil da minha vida porque tinha que agir como alguém que eu não era."
Zoey começou a se identificar como mulher desde jovem.
Quando criança ela costumava perguntar à mãe por que "Deus cometeu um
engano" e deu a ela o corpo errado.
'Não incitei minha filha a passar por isso', diz mãe de Zoey/ Foto: BBC
Os supressores de puberdade usados por ela são
medicamentos de efeitos reversíveis e aprovados por autoridades
britânicas, pois são usados originariamente há décadas para tratar de
crianças que apresentam puberdade prematura.
Mas para pessoas com disforia de gênero, ou desordem de
identidade de gênero, os medicamentos são ministrados entre 9 e 17 anos.
Os médicos dizem que estão dando tempo à criança para decidir se
realmente quer viver com um gênero diferente.
Adolescentes também podem tomar hormônios para se desenvolver no gênero oposto.
Esses bloqueadores começaram a ser usados em crianças
transgênero nos anos 1990. A médica de Zoey, Johanna Olson, diretora do
departamento que trata desses casos no Hospital de Crianças de Los
Angeles, começou a prescrever os remédios em 2007.
"Certamente há medos relacionados aos efeitos
colaterais", disse Olson. Ela afirmou que uma de suas pacientes, de 12
anos de idade, tentava cometer suicídio toda vez que menstruava.
Olson afirma que é preciso celebrar os transgêneros e não apenas tolerá-los/ Foto: BBC
Olson afirma que é preciso celebrar os transgêneros e não apenas tolerá-los
"Então, certamente, é preciso levar isso em conta. Eu
poderia perder a criança antes de termos informações suficientes para
dizer 'sim, isso é uma intervenção segura em um adolescente de 12 ou 13
anos, ela pode se matar'."
Há um grande debate na comunidade médica sobre quando iniciar o uso de bloqueadores e terapia hormonal de mudança de sexo.
Kenneth Zucker, especialista em identidade de gênero do
Centro de Dependência e de Saúde Mental de Toronto, diz que sua clínica
normalmente espera até que os pacientes tenham 16 anos antes de
prescrever hormônios para permitir que as pessoas se desenvolvam no sexo
oposto.
Mas a clínica tem utilizado bloqueadores de puberdade em
crianças a partir dos 10, dependendo de quando eles começam a
puberdade.
Tanto Olson quanto Zucker dizem que tiveram muitos
poucos relatos de arrependimento de seus pacientes que receberam
bloqueadores de puberdade.
Mas Zucker diz que fez um estudo que mostrou que mais de
80% das crianças que foram à clínica e não foram tratados com
bloqueadores hormonais estavam satisfeitos em seu gênero biológico
quando chegaram aos 22 anos.
Debate
"Há um debate sobre a idade mínima que alguém deve ir no início do tratamento hormonal para reprimir a puberdade", disse ele à BBC.
"Há um debate sobre a idade mínima que alguém deve ir no início do tratamento hormonal para reprimir a puberdade", disse ele à BBC.
"Eu acho que o que vai ficar interessante nesta área nos
próximos 10 anos é que, pelo menos em alguns setores, há agora uma
abordagem muito mais permissiva para o apoio à terapia hormonal de
mudança de sexo e até mesmo cirurgia e a questão vai ser: 'A abordagem
mais permissiva vai estar correlacionada com mais arrependimentos ou
mais insatisfação?'"
Algumas crianças transgênero compram medicamentos
ilegais na internet para tentar se tratar, muitas vezes com
consequências graves.
Antes de receber bloqueadores de puberdade, as crianças
devem passar por avaliações de saúde mental, rigorosos exames médicos e
aconselhamento. Olson diz que os melhores resultados são obtidos com o
início do uso de bloqueadores hormonais aos primeiros sinais da
puberdade. Isso se torna mais complicado pelo fato de que as crianças
estão passando pela puberdade mais jovens.
Alguns críticos dizem que o número crescente de crianças
transgênero é devido a pais urbanos e liberais indo longe demais com
crianças que poderiam apenas estar fazendo experiências e testando
convenções.
A realidade é que a internet é, provavelmente, o maior
fator que justifica o aumento de crianças transexuais, com famílias
diferentes encontrando outras e trocando histórias sobre seus filhos que
parecem estar passando por uma fase que, aparentemente, nunca termina.
Família
A mãe de Zoey, Ofelia, é uma trabalhadora hispânica, mãe solteira de três filhos, que não sabia nada sobre transexuais até que seu filho começou a dizer: "Eu sou uma menina." Agora ela é uma defensora dos direitos transexuais.
A mãe de Zoey, Ofelia, é uma trabalhadora hispânica, mãe solteira de três filhos, que não sabia nada sobre transexuais até que seu filho começou a dizer: "Eu sou uma menina." Agora ela é uma defensora dos direitos transexuais.
"É
bobagem pensar que estou incitando uma criança a passar por isso. Se
você entender o quanto é difícil para eles fazer esta transição, para
ser aceito entre os seus pares, as lutas que eles têm que passar, a dor
que eles têm que atravessar...", disse Ofelia.
"Isso é quem minha filha é - isso faz sentido. Para mim e
minha família isso funciona. Ela está feliz. Ela está na escola. Ela
está aprendendo. Não há nada de diferente nela. Ela é apenas transgênero
- e é isso."
Devido à crescente conscientização sobre transgêneros,
os médicos dizem que suas clínicas têm sido inundados com pacientes ao
longo dos últimos anos. A Associação Médica Americana publicou
diretrizes para ajudar os médicos.
Adultos transgêneros que não podem viver facilmente como
sua identidade de gênero têm maiores taxas de suicídio, são mais
propensos a ser assassinados, e muitas vezes sofrem discriminação no
local de trabalho.
"Não há nenhuma recompensa por ser transgênero, nenhuma
recompensa. Há uma vida tomando remédios, desistindo de sua fertilidade,
é mais difícil viver sendo trans," diz Olson, ressaltando que as
pessoas que decidem fazer a transição sentem que esta é a única opção
que eles têm para viver com seu verdadeiro eu.
"A experiência trans é notável - passar por ambos os
sexos -, é tão raro. Vamos comemorar isso, e não apenas tolerar. Temos
algo a aprender com as pessoas trans."
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