Transexual Beatriz Calore: "Sou quase órfã.
Minha mãe já morreu e meu pai não fala comigo.
Ele sabe da situação em que estou, mas não quer me ver.
Lésbicas, gays, bissexuais e transexuais ainda têm muito a conquistar na luta pelos seus direitos. Dentro do grupo, os “Ts” da sigla LGBT estão em especial desvantagem, porque lidam com a estranheza e o preconceito vindos de fora e vivem ainda, em muitos casos, uma constante batalha para aceitar a eles próprios.
O 21º Congresso da Associação Mundial pela Saúde Sexual, realizado em Porto Alegre, discutiu essa questão, em outubro do ano passado. A psicoterapeuta norte-americana Lin Fraser, presente ao evento, é especialista no assunto. “Os trans são pessoas que sentem saudade do que nunca foram e gostariam de ser, de um lugar emocional onde gostariam de estar”, explica.
Compreender como lidar com transexuais, ela conta, é um desafio até para estudiosos em sexualidade e gêneros. Dos anos 1990 para cá, apelar para a psicoterapia já foi prática indicada, deixada de lado, obrigatória e, atualmente, altamente recomendada para aqueles ou aquelas que querem se entender ou, ainda, se submeter à troca de sexo.
“Só a partir de 2010 é que se chegou a um consenso de que a transexualidade não deve ser tratada como patologia. Não é doença ou distúrbio. A expressão das características de gênero é ampla, vai muito além de héteros e homossexuais, e cabe ao psicoterapeuta ajudar o paciente a encontrar conforto em quem é”, afirma.
Terapia do coração
A linha de auxílio psicológico que se mostra mais eficiente para os trans é a terapia emocional – ou, como gostam de denominar os profissionais que a aplicam, a “terapia do coração”. Ela se baseia no vínculo afetivo entre terapeuta e paciente, na empatia mútua que precisa surgir desde a primeira consulta. “Não é possível ajudar um transexual sem conhecer a trajetória dele. E, para abrir suas histórias e angústias, se sentir acolhido e seguro, ele precisa saber que a pessoa à sua frente não ficará chocada com nada que ele disser”, justifica Lin.
Se possível, a família deve participar desse processo. Não raro, pais e irmãos sentem muita dificuldade para entender e aceitar o parente transexual e também precisam de ajuda. A psicoterapeuta esclarece: “Nunca se tentará alterar ou ‘curar’ um trans – até porque, mais uma vez, não é doença. Devemos, juntos, explorar seu papel social, desenvolver nele resiliência e segurança. Acolhido pelo terapeuta e pela família, ele conquistará a confiança de que pode ser amado e pleno”.
A palavra que não pode ser pronunciada
Para Mariela Castro Espín, diretora do Centro Nacional Cubano de Educação Sexual e ativista pelos direitos LGBT, os transexuais podem ter a necessidade de auto entendimento, mas é a sociedade que precisa ser transformada – para o seu próprio bem. “São muitos os meios de discriminar socialmente um trans, da família ao mercado de trabalho, passando pelos espaços religiosos. Mas as maiores vítimas dessa desintegração são as pessoas que se prendem a esse preconceito. Não se constrói uma sociedade de valor com exclusão”, acredita.
Também participante do congresso, ela explicou que a estratégia de integração atualmente aplicada em Cuba é multidisciplinar, com assistência de saúde abrangente, especializada e gratuita, programa de educação sexual e serviço de orientação legal para pessoas trans. “Lembremos da luta por direitos das mulheres. Integrar transexuais é um mecanismo de trabalho de direitos humanos”, defende.
Lin concorda e acrescenta que a própria linguagem precisa evoluir: “Muita gente tem medo de falar a palavra transexual, de chamar um transexual de transexual. Daí vêm os ‘apelidinhos’, as ‘brincadeiras’ que mais ofendem do que ajudam. Se faz necessário tirar a carga de preconceito dessa terminologia, fazer com que ela também seja socialmente confortável”.
Disponível em: http://www.alagoas24horas.com.br/conteudo/?vCod=203227
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